Surpreza

By Miguel J. T. Mascarenhas

The Project Gutenberg EBook of Surpreza, by Miguel J. T. Mascarenhas

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Title: Surpreza
       Entre-acto original

Author: Miguel J. T. Mascarenhas

Release Date: April 29, 2008 [EBook #25241]

Language: Portuguese


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SURPREZA


SURPREZA


ENTRE-ACTO

ORIGINAL

DE

MIGUEL J. T. MASCARENHAS


PORTO

Typographia Lusitana

84--Rua das Flores--84

1873.




PERSONAGENS


    _Laura_, costureira.

    _Alfredo_, tenente.

    _João_, camarada d'Alfredo.

    _Arthur_, menino de 9 annos, irmão de Laura.


        _Ill.^mo e Ex.^mo Gaspar Lobo de Sousa Machado e Couros._


    Meu bom amigo: duas horas,--rigorosamente duas horas--uma que furtei
    a um auto de «pinhora», e outra a um «dito» de «embargo» quando
    «escrivão» na Beira, deram em «conclusão» o «Entre-acto» que de lá
    te offertei. Disse-te que fôra applaudido, e não menti: applausos
    serranos em theatrinho aldeão.

    Porque foi que me lembrei de «ajuntar» o teu nome ao meu thesouro
    litterario da serra?...

    De certo presentimento de que tu havias de ser, como effectivamente
    succedeu, um dos mais poderosos auxiliares para finalisar o meu
    desterro.

    É esta a primeira occasião que tenho de publicar o escripto que te
    dediquei, e não a perco: vai «appenso» do meu unico livro,
    e provo-te, d'este modo, a existencia em mim de um sentimento,
    mixto de orgulho e gratidão, que tu sabes comprehender e desculpar.

        Porto, 15 de Setembro de 1873.

            teu dedicado e obrigadissimo amigo,

            Miguel J. T. Mascarenhas.




SURPREZA

     *     *     *     *     *

ENTRE-ACTO

Uma saleta pobre, com um fogareiro de barro, mesa e ferro de engommar,
um cesto de costura que deve conter uma caixinha, etc.




SCENA I

LAURA E ARTHUR


(_Laura, canta e engomma, e Arthur trata do fogão_)

Laura (cantando):

    Ai! mundo!! mundo!... como és tyranno!
    És deshumano p'ra mulher cahida...
    Ai! misera orphã sem um tecto amigo,
    Sem um abrigo que te dê guarida!...

    Morrêr tão nova?!... acho cêdo ainda...
    Mulher, e linda... que horror! perdida!...
    Quando a purêsa no gosar fenece...
    Ai! desfalece todo o amor á vida!...

(_Vendo que Arthur desmancha qualquer coisa no fogão_):

Es um desastrado, Arthur; pois já tens idade para algum juiso... Estás a
fazer onze annos... (_Vae compor o fogão, e Arthur espreitar á porta_).

Arthur (voltando, com receio e meiguice):

Desculpa, Laurinha, minha querida irmã, desculpa, que me pareceu ouvir a
voz do snr. tenente, e tu bem sabes quanto eu gósto d'elle...

Laura (enleiada):

A voz do snr. Alfredo!... Ainda não são as horas do costume...
(_dirige-se á mesa, em quanto Arthur faz qualquer traquinice pela casa,
e fica um pouco pensativa_): Arthur tem razão... A pobre criança parece
que adivinha os favores que devemos ao snr. tenente... se não fôra aquella
boa alma, teriamos, eu e meu irmão, succumbido... (_trabalhando, e
fallando, etc._) Não sei bem, se é só gratidão o que eu sinto... Os poucos
dias que deixo de vêl-o, é como se me faltasse o ar que respiro!... se
_Elle_ é tão bom, tão caritativo!... E nunca lhe ouvi uma palavra
atrevida, nunca lhe vi um gesto menos respeitôso!... Elle... que podia
abusar... que... (_pousando o ferro_): Meu Deus! E se elle fosse meu
pae?!... Quem sabe?... Achei-me tão nova desamparada no mundo, e com
este meu irmãosinho nos braços...

Arthur (vindo ao pé da irmã):

Ó Laura, tu que estás ahi a resmungar?... Não estejas triste, não?...
Se estás assim por minha causa, eu prometto de nunca mais fazer tolices...
Deixas-me tu ir para a porta da rua esperar o snr. tenente, deixas?...

Laura (ameigando-o):

Pois vae, vae, mas não te ajuntes com os garotos, ouviste?

Arthur (indo aos saltos):

Não junto... só hei de vêr como elles jogam o peão...




SCENA II

LAURA (só)


Laura (largando de engommar, e pegando na costura):

Muito penosa é a vida dos que vivem só para o trabalho... E o lucro que
as mulheres tiram d'elle, não chega para matar a fome... se não fôra o
meu protector pagar-me a renda da casa, ter-me-ia outra vez reduzido á
penuria extrema, e... matava-me, para fugir á deshonra... (_pausa_)
Horrorisa-me a idéa da vida que passam essas infelizes mal encaminhadas...
O mundo não vê na mulher pobre mais do que um estimulo para os seus
brutaes appetites!... Nova, como ainda sou, já por minha desgraça conheci
isto; mas a Providencia, pela mão do sr. tenente, salvou-me do suicidio...




SCENA III

ARTHUR E LAURA


Arthur (entrando a correr):

Ó Laura, deram-me esta carta para te entregar... (_dá a carta, e volta
para a porta da rua_).




SCENA IV

LAURA (só)


Laura

É d'_Elle_!... Estará doente, meu Deus!... (_abre a carta, e lê_): «Menina
Laura.--É hoje mais um dos poucos dias em que me vejo obrigado a
faltar-lhe com a minha visita á hora do costume... Peço-lhe que não lance
esta falta na conta de esquecimento, por que a tenho sempre presente no
pensamento e no coração. Até mais logo. Seu muito amigo, Alfredo.»
(_Declamando_): Felizmente, é só algum estorvo da vida militar, e ainda
hoje terei o prazer de vêl-o. (_Deixa a carta no cesto da costura_).




SCENA V

LAURA E JOÃO


João (trazendo, n'um taboleiro, alguma roupa branca):

(_Fallando de fóra_): Dá licença, menina?

Laura

Alguma obra, talvez... Entre, quem é?

João (entrando):

Ora, guarde Deus aqui tudo, e vivam os homens de guerra, e as meninas
engommadeiras... (_reparando em Laura_): Palavra de honra, que a menina
merece ainda bem a _continencia_... (_mudança de tom_): Desculpe-me estes
geitos de _tarimba_, e estas graçolas já improprias dos meus annos,
menina, que não ha mal nenhum n'isto. Cá o velho 38, ha muito que esqueceu
as graças do matrimonio... (_com tristeza_): Ha bastantes annos, que perdi
a minha boa Antonia, Deus lhe falle n'alma, e um filho, ou dous, quê...
(_pausa: resignando-se_): Deixêmos tristezas, que não pagam dividas, e
vamos ao que serve... Olhe, menina, trago-lhe aqui estas camisas para
engommar. O meu tenente tinha por engommadeira uma pobre velhinha, que
mais lhe estragava do que engommava as camisas, mas que elle ainda assim
conservava, por que é o melhor dos tenentes... Vae, se não quando, a velha
adoece, e eu vou hoje procurar uma camisa engommada para dar ao meu
tenente, e... vistel-a?... nem eu!... Indaguei onde haveria uma
engommadeira boa, e disseram-me que perguntasse pela menina Laura, n'esta
rua. Chego á porta d'esta casa, vejo uns rapasitos a jogar o peão...

Laura (interrompendo-o):

Disseram-lhe que era aqui, e entrou... Pois, sr., eu farei por substituir
a velhinha o melhor que possa.

João

_Faça alto!_... Substituir a velha, é que não, por que tinha de ir lá para
casa, e apesar do tenente ser... o melhor dos tenentes, é ainda novo, e...
_o lume ao pé da estopa_...

Laura (interrompendo-o):

Quem, como eu, foi em criança abandonada com um irmãosinho pequeno nos
debeis braços, e soube até hoje sustentar-se virtuosa, preferindo perder
a vida a perder a honra, parece que não poderia têr grande receio do seu
tenente...

João

Então, _guarda dentro_... Já aqui não está quem fallou... Visto que a
menina é assim _arisca_, muda o caso de figura... Ora, diga-me: poderei
saber a sua historia?... Eu sou curioso como um soldado vadio em dia de
_pré_; e como deixei tudo arrumado em casa, e o tenente está para o
quartel, posso, sem receio, demorar-me.

Laura (offerecendo cadeira ao soldado):

A minha historia, conta-se em poucas palavras: teria completado dez annos
de idade, quando morreu minha santa mãe. A infeliz, chorava todos os dias
a ausencia de meu pae, que, dizia ella, fôra com o general conde das Antas
para a expedição de Hespanha...

João (interrompendo-a, visivelmente alterado):

Para a expedição de Hespanha, diz a menina?!...

Laura

Sim, senhor. O que tem isso de extraordinario?...

João (forcejando por tranquilisar-se):

Diz bem... o que tem isso de extraordinario?... É que... Queira continuar,
menina, queira continuar...

Laura

A falta de recursos em que viviamos, fez com que a minha pobre mãe
morrêsse quasi á mingoa de pão e de tratamento... (_movimento em João,
etc._) Eu, mal podia então avaliar a desgraça que vinha sobre mim...
Quando vi minha mãe morta, chorei muito, gritei, clamei por soccorro e,
como ninguem acudisse, sahi de casa com meu irmão ao collo, continuando a
gritar pelas ruas, até que uma caridósa mulher me recolheu no seu pobre
albergue...




SCENA VI

OS MESMOS, E ARTHUR


Arthur (correndo):

(_Traz pendente do pescoço de modo visivel uma medalha de cobre_).--Ó
Laura, perguntaram-me por ti lá em baixo. Eu estava a vêr jogar o peão...
(_reparando no soldado_): Ah! cá está o senhor que perguntou por ti...

João

(_Repara na medalha, levanta-se repentinamente, examina-a etc._) Esta
medalha!!...

Laura

É uma reliquia, que minha santa mãe dizia ter vindo de Roma, e que lançou
ao pescoço de meu irmão, pouco antes de morrer...

João (excitadissimo):

Menina!... por alma de sua mãe lhe peço, que me diga se conserva alguma
carta que seu pae escrevêsse!...

Laura

Conservo. Tenho-a aqui no meu cesto de costura, n'esta caixinha, para
nunca me separar d'ella... Olhe, aqui a tem.

João

(_Desdobra a carta todo trémulo, etc, e diz como em delirio_): Antonia!...
Cá está... é a mesma... foi escripta em cima de um tambor antes de entrar
em fôgo... E _Ella_ cá a morrer de fome!... e meus filhos!... (_grito
dolorôso_): Ah!... (_cae sem sentidos na cadeira_).

Laura (correndo a elle):

Que é isto, meu Deus!... Elle morre!... Se viésse o sr. tenente...
(_afflicta_): Nunca fui a sua casa, mas vou agora... Não posso estar
aqui só com este homem assim... (_entra nos bastidores, e sae de capote:
Arthur segue-a sempre_): Ainda sem sentidos!... (_apanha a carta do pae,
que este deve ter deixado cahir, e guarda-a_): Vamos, Arthur, vamos
depressa... (_sahem_).




SCENA VII

JOÃO (só)


João

(_Como accordando, etc._) Que sonho tão mau!... Só tive um igual quando
fui mortalmente ferido, para salvar a vida ao meu tenente... Mas onde
estou eu?!... Ah!... sim, estou em casa da engommadeira, que se chama
Laura, que era tambem o nome de minha filha... E a historia d'estas
crianças?!... E a carta?!... (_Procura a carta, e pega na que é do
tenente_): Eil-a aqui!... Não é, pois, sonho, meu Deos?!... É certo que
tenho dous filhos?!... Laura, minha querida filha!... (_pausa_): Sahiu...
foi, talvez, chamar algum medico... É preciso tranquillisar-me, para o
receber como um homem que é soldado... Estas fraquezas excessivas, não
ficam bem a um militar, praticadas diante de um estranho... Vou lêr a
carta que escrevi á minha pobre Antonia, quando pensava que ainda a
abraçaria muitas vezes... (_abre a carta, principia a lêr, e fica como
fulminado_): «Menina Laura!!...» Que é isto?!!... Estarei eu louco?!!...
(_acaba de lêr para elle: gargalhada terrivel_): Ah!... ah!... ah!...
ah... Então, não queria eu achar uma filha virtuósa, depois de dôze annos
de desamparo?!... Impossivel!... (_pausa_): Em vez da ventura domestica
para o resto dos meus dias, deparo com a deshonra ao cabo de trinta annos
de serviço!... Bravo militar!... enche-te de orgulho com as tuas
feridas!... a paga d'ellas, foi deixarem-te morrêr a mulher á fome!...
e a condecoração, é a deshonra da filha!!... (_mudança de tom_): Mas ha
aqui um seductor, que ha de pagar com a vida a minha vergonha... Eu o
juro, á face de Deus!... Occulto n'aquelle quarto, poderei
surprehendêl-os, e vingar-me... Depois... um tiro na cabeça, e era uma
vez o 38!... (_entra precipitadamente no quarto_).




SCENA VIII

LAURA E ARTHUR


Laura

Não tive coragem de ir a casa do snr. tenente: encontrei uma conhecida,
por quem lhe mandei recado... (_reparando_): Mas onde está o meu
doente?!...




SCENA IX

OS MESMOS, E ALFREDO


Alfredo (amavel):

Mais depressa ninguem obedesse ás ordens da sua dama... (_aperta a mão a
Laura_): Como está o meu anjo de resignação, a linda escravasinha do
trabalho?... (_Logo que o tenente entra, Arthur fica polando de contente,
pega-lhe na mão que elle tem livre, etc. Alfredo chega uma cadeira a
Laura, e assenta-se tambem ao seu lado, collocando Arthur sobre os
joelhos, que fica constantemente mechendo ora nas dragonas, ora nas mãos
e no bigode do official_).

Laura

(_Pega na costura mas não trabalha_): Estou muito triste, snr. tenente...
Ia para casa de v. s.^a participar-lhe que um pobre velho, camarada de
um senhor official, adoecêra n'esta casa, vindo trazer-me umas camisas
para engommar. Deixei-o aqui parecendo morto, e, já no caminho, encontrei
a pessoa por quem lhe mandei pedir que viesse, e voltei a casa com muito
cuidado no infeliz camarada. Chego, pouco antes de v. s.^a, e não encontro
o homem!...

Alfredo

Não se espante a Laurasinha com o acontecimento, que é o mais natural
possivel. O homem tem fibras de soldado velho: accordou, viu-se bom, e só,
e foi tratar da sua vida, ou da vida do official de quem é camarada...
Deixêmos essas tristezas, que já passaram, e diga-me a minha querida
protegida se ha por aqui abundancia de trabalho, e o dinheiro preciso
para as suas pequeninas necessidades...

Laura

Não me falta cousa alguma, graças á sua valedôra protecção, sr. tenente...

Arthur

(_Pondo a mão na cara do official_): Deixe fallar minha irmã, sr.
tenente, que não diz a verdade... (_com ingenuidade infantil_): Ha tres
dias, que só comêmos caldinho...

Laura

Que estás tu a dizer, meu traquinas?...

Alfredo

Fizeste bem em fallar, Arthur... A innocencia não sabe _guardar as
conveniencias_... Então, a má da sr.^a Laura, esqueceu-se de mim, não é
verdade?!...

Laura (enleiada):

Eu... não queria ser mais pesada, a quem já devo tanto...

Alfredo (pondo o pequeno no chão):

Vae, Arthur, vae para a porta da rua, para os teus encantos, que eu
preciso de ralhar muito a tua irmã, e não quero que tu oiças...
(_reparando nas luvas, que o pequeno lhe sujou_): E já que me pozeste as
luvas n'este bonito estado, pega n'ellas, e faze dous saquinhos, anda...
(_Arthur dá um beijo no tenente, recebe outro, e sahe muito contente._)




SCENA X

ALFREDO E LAURA


Alfredo

Vou fallar-lhe muito seriamente, menina Laura... Quando eu, haverá nove
annos, a encontrei casualmente n'um miseravel sotão quasi asfixiada,
querendo tambem matar o pequenino Arthur, seu irmão,--fiz o que faria
todo o homem, que ainda não tivesse a alma completamente estragada pelas
convenções do mundo tôrpe. Ouvi a sua singela e muito infeliz historia,
admirei a austéra virtude da sua boa indole, e protegi-a. Desde então até
hoje, se a minha assiduidade junto da menina póde ser mal vista pelos
perversos, é certo que as nossas consciencias estão tranquillas. Sua mãe,
Laura, não teria mais cuidado pela conservação da sua virtude do que
este... _devasso_ militar, como talvez o mundo me chame... Podia dar-lhe
todo o necessario, tiral-a ao trabalho pesado que exerce, cercal-a até de
algum luxo; mas preferi velar apenas por que não entrasse em sua casa a
miseria, deixando-lhe toda a gloria da sua honra pelo trabalho...
Comprehenda-me bem, Laura. Um homem que assim procede, póde ter alguma
coisa occulta no coração, mas de certo não merece o seu despreso... Fallo
assim, para concluir por lhe dizer, que soffri muito ha pouco, que estou
soffrendo ainda por ouvir da bocca de um innocente, que a menina occulta
de mim as suas precisões, provando por tal fórma, que não confia no homem
que ha nove annos a estima como um verdadeiro irmão!...

Laura

(_Muito terna, beijando-lhe a mão_): Não é isso, sr. Alfredo... Perdoe-me,
se entendo mal, mas eu queria ser-lhe pesada o menos possivel...
Pareceu-me comprehendêl-o... Devo-lhe, alem de tudo, o saber lêr nos
livros que me dá, livros de certo escolhidos, por que só n'elles tenho
aprendido rasgos de virtude e de heroismo... Não acredite que em mim
exista um sentimento mau a seu respeito... seria crueldade imaginal-o
sequer... Eu, não tenho no mundo outra affeição... É a v. s.^a que
pertence toda a minha alma...

Alfredo (interrompendo-a):

Pela gratidão... Bem sei que a menina é um compendio de virtudes não
vulgares.

Laura (muito enleiada):

Não é só a gratidão... Deixe-me dizer-lhe, o que ha muito mora no meu
peito... v. s.^a é para mim mais que um irmão... já me lembrei se seria
meu pae... É ainda novo, mas era possivel... Sei que o amo muito...
creia-me... Se me faltasse, morria... (_com força_); Oh... juro-lhe que
morria!...

Alfredo (contentamento suffocado):

Obrigado, Laura! Sabe lá o bem que me fez com o que acaba de
confessar-me?! Tambem eu estou orfão de parentes e mais orfão ainda de
crenças n'essa pervertida sociedade onde as minhas dragonas me dão
entrada... Sonhei muitas vezes com a felicidade ao seu lado, Laura, mas
temia de encontral-a suspeitósa das minhas intenções... Obrigado por me
abrir o céu com as suas palavras... Attenda bem ao que lhe digo: estou a
tocar nos quarenta annos. Esta idade, não deixa nutrir illusoes, mas
ainda póde conservar bem vivo o coração... o meu--juro-lh'o sob palavra
de cavalheiro--tem o mesmo calor dos vinte annos... Não posso, nem sei
dizer-lhe mais... Peço-lhe pela memoria de sua mãe, que me diga com toda
a força da sua convicção se não repugna á sua mocidade a juncção com a
minha quasi velhice...

Laura (abraçando-o):

Repugnar-me, Alfredo?!!... (_como que admirada da sua audacia, retirando
os braços vagarosamente, etc._); Perdão, sr. tenente... O meu
contentamento deu-me audacia, que ha uma hora julgaria loucura...

Alfredo (beijando-a na testa):

O amor nunca é audaz, minha querida Laura, é um sentimento nobilissimo,
que faz desapparecer todas as distancias... (_jubilôso_): Seremos felizes,
muito felizes!... Havemos de causar inveja aos mais felizes da terra!...
Hei de...




SCENA XI

OS MESMOS, E JOÃO


João (terrivel de raiva concentrada):

Casar á franceza... não é verdade, meu tenente?!... (_os dous separam-se,
e João occupa o centro da scena, etc._):

Alfredo

O meu camarada!...

Laura

O homem doente!...

João (sempre ironico e terrivel):

O seu camarada, sim, meu tenente... aquelle soldado raso que aproveitou
algumas cutiladas, para o salvar de uma infallivel morte... Era o dever
do inferior... Agora, ao superior, cumpre-lhe pagar com a deshonra...

Alfredo (rispido):

Endoideceste, homem?!...

Laura

Que direitos são os seus, para estar com esses modos em minha casa?!...

João

Em sua casa, menina?... Por que não diz antes _em nossa casa_?... Era mais
verdadeira, não occultando a _parte_ do sr. tenente...

Alfredo (com imperio):

Nem mais uma palavra, soldado!... Vá immediatamente para casa, e lá
ajustaremos contas...

João (cada vez mais furiôso):

Hei de ir para casa, meu tenente... para uma casa que se fez logo que eu
nasci, e que tem uns oito palmos de comprido... mas antes de me levarem
para lá, quero contar-lhe em poucas palavras toda a minha vida... Fui
casado á face da egreja, meu tenente... Minha mulher morreu de fome, em
quanto eu batalhava pela liberdade da Peninsula... Ficaram-me dous filhos,
que julguei mortos... não morrêram, por desgraça minha... Esta mulher,
que hade partilhar, se nâo partilhou já, da infamia dos seus amores... é
minha filha!... (_Laura, toda trémula, etc. prostra-se de joelhos_):
Agora, sr. tenente, (_no auge da colera_): vou com estas mãos arrancar
uma vida, que já conservei á custa da minha!... (_Faz acção de arremetter
contra o tenente e Laura arrasta-se de joelhos para os pés do pae, que
não faz caso d'ella. Alfredo, toma repentinamente attitude militar, e
brada em voz de commando_):

Alfredo

Perfilado, 38!... Perfilado!... (_Lucta de gestos de João, entre a raiva
e o dever militar, vencendo este por fim, e perfilando-se. Isto deve
demorar-se, até o Arthur dizer o--áparte--da scena seguinte. Logo que
João se perfila, toca a orchestra em surdina até ao fim_)




SCENA XII

OS MESMOS, E ARTHUR


Arthur

(_Entra, correndo, pelo fundo, e, vendo a irmã de joelhos e a chorar,
toma o outro lado da scena, ajoelha tambem, pega na reliquia que traz ao
pescoço, beija-a, e diz á parte_): Diz minha irmã, que a nossa mãe a
ensinou a beijar esta reliquia quando tivesse afflicçòes... e como ella
chora é por que soffre... (_conserva-se de joelhos observando a scena_).

Alfredo (muito grave):

O soldado que levanta a mão contra o seu superior, é fuzilado...
Salvou-me uma vez a vida, devo salvar hoje a sua... Vou alcançar-lhe
baixa com data de hontem (_Pausa_). Pergunte na minha ausencia a sua
filha, o que eu tenho sido para ella... (_a Laura, que ajuda a
levantar-se_): Senhora Laura... perdoe-me este acontecimento de que fui
causa involuntaria... e adeus!... (_Laura affoga-se em soluços, e
Alfredo, tendo dado alguns passos ao fundo, fica olhando para ella
indeciso_).

Arthur

(_Levanta-se, corre ao tenente, pega-lhe na mão, e chama-o á scena_):
Então o meu amiguinho vê minha irmã a chorar, e quer deixal-a?!...

Alfredo (beijando o pequeno):

Menina Laura... Peça a seu pae que a deixe casar com o tenente Alfredo...

João

(_Tem sempre estado perfilado, e move-se repentinamente_): Pois isso é
sério, meu tenente?!...

Alfredo

Já me viu faltar a um juramento, João?

João (rapido):

Nunca!

Alfredo (solemne):

Juro-lhe pela cruz da minha espada, que dentro em oito dias hei de ser
seu genro _á face da egreja_.

João

(_Louco de contentamento, abraçando o tenente pelos joelhos, etc._):
Isto é que se chama uma _surpreza_, que póde fazer morrer de alegria!...
(_Indo buscar Laura_): Anda, minha querida filha, amor do meu coração,
retrato vivo de tua santa mãe, anda abraçar o teu anjo, o nosso anjo
salvador!... (_Os tres formam grupo, etc._):

Arthur

(_Salta a uma cadeira, colloca-se entre os hombros do pae e os do tenente,
e diz para a irmã_): Ó Laura, qual d'estes senhores é o nosso pae?...

João

(_Apertando-o contra o peito e beijando-o_): Somos ambos, meu filho, e
tudo aqui respira alegria e felicidade!...

Arthur

Pois beijem todos esta reliquia, que foi a que fez o milagre...
(_Sorriem-se todos, beijam a medalha, e affagam o pequeno. Rompe a
orchestra._)


CAHE O PANNO.





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     you already use to calculate your applicable taxes.  The fee is
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     has agreed to donate royalties under this paragraph to the
     Project Gutenberg Literary Archive Foundation.  Royalty payments
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     prepare (or are legally required to prepare) your periodic tax
     returns.  Royalty payments should be clearly marked as such and
     sent to the Project Gutenberg Literary Archive Foundation at the
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     the Project Gutenberg Literary Archive Foundation."

- You provide a full refund of any money paid by a user who notifies
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     distribution of Project Gutenberg-tm works.

1.E.9.  If you wish to charge a fee or distribute a Project Gutenberg-tm
electronic work or group of works on different terms than are set
forth in this agreement, you must obtain permission in writing from
both the Project Gutenberg Literary Archive Foundation and Michael
Hart, the owner of the Project Gutenberg-tm trademark.  Contact the
Foundation as set forth in Section 3 below.

1.F.

1.F.1.  Project Gutenberg volunteers and employees expend considerable
effort to identify, do copyright research on, transcribe and proofread
public domain works in creating the Project Gutenberg-tm
collection.  Despite these efforts, Project Gutenberg-tm electronic
works, and the medium on which they may be stored, may contain
"Defects," such as, but not limited to, incomplete, inaccurate or
corrupt data, transcription errors, a copyright or other intellectual
property infringement, a defective or damaged disk or other medium, a
computer virus, or computer codes that damage or cannot be read by
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of Replacement or Refund" described in paragraph 1.F.3, the Project
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Gutenberg-tm trademark, and any other party distributing a Project
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liability to you for damages, costs and expenses, including legal
fees.  YOU AGREE THAT YOU HAVE NO REMEDIES FOR NEGLIGENCE, STRICT
LIABILITY, BREACH OF WARRANTY OR BREACH OF CONTRACT EXCEPT THOSE
PROVIDED IN PARAGRAPH F3.  YOU AGREE THAT THE FOUNDATION, THE
TRADEMARK OWNER, AND ANY DISTRIBUTOR UNDER THIS AGREEMENT WILL NOT BE
LIABLE TO YOU FOR ACTUAL, DIRECT, INDIRECT, CONSEQUENTIAL, PUNITIVE OR
INCIDENTAL DAMAGES EVEN IF YOU GIVE NOTICE OF THE POSSIBILITY OF SUCH
DAMAGE.

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providing it to you may choose to give you a second opportunity to
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in paragraph 1.F.3, this work is provided to you 'AS-IS' WITH NO OTHER
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with this agreement, and any volunteers associated with the production,
promotion and distribution of Project Gutenberg-tm electronic works,
harmless from all liability, costs and expenses, including legal fees,
that arise directly or indirectly from any of the following which you do
or cause to occur: (a) distribution of this or any Project Gutenberg-tm
work, (b) alteration, modification, or additions or deletions to any
Project Gutenberg-tm work, and (c) any Defect you cause.


Section  2.  Information about the Mission of Project Gutenberg-tm

Project Gutenberg-tm is synonymous with the free distribution of
electronic works in formats readable by the widest variety of computers
including obsolete, old, middle-aged and new computers.  It exists
because of the efforts of hundreds of volunteers and donations from
people in all walks of life.

Volunteers and financial support to provide volunteers with the
assistance they need, is critical to reaching Project Gutenberg-tm's
goals and ensuring that the Project Gutenberg-tm collection will
remain freely available for generations to come.  In 2001, the Project
Gutenberg Literary Archive Foundation was created to provide a secure
and permanent future for Project Gutenberg-tm and future generations.
To learn more about the Project Gutenberg Literary Archive Foundation
and how your efforts and donations can help, see Sections 3 and 4
and the Foundation web page at https://www.pglaf.org.


Section 3.  Information about the Project Gutenberg Literary Archive
Foundation

The Project Gutenberg Literary Archive Foundation is a non profit
501(c)(3) educational corporation organized under the laws of the
state of Mississippi and granted tax exempt status by the Internal
Revenue Service.  The Foundation's EIN or federal tax identification
number is 64-6221541.  Its 501(c)(3) letter is posted at
https://pglaf.org/fundraising.  Contributions to the Project Gutenberg
Literary Archive Foundation are tax deductible to the full extent
permitted by U.S. federal laws and your state's laws.

The Foundation's principal office is located at 4557 Melan Dr. S.
Fairbanks, AK, 99712., but its volunteers and employees are scattered
throughout numerous locations.  Its business office is located at
809 North 1500 West, Salt Lake City, UT 84116, (801) 596-1887, email
[email protected].  Email contact links and up to date contact
information can be found at the Foundation's web site and official
page at https://pglaf.org

For additional contact information:
     Dr. Gregory B. Newby
     Chief Executive and Director
     [email protected]


Section 4.  Information about Donations to the Project Gutenberg
Literary Archive Foundation

Project Gutenberg-tm depends upon and cannot survive without wide
spread public support and donations to carry out its mission of
increasing the number of public domain and licensed works that can be
freely distributed in machine readable form accessible by the widest
array of equipment including outdated equipment.  Many small donations
($1 to $5,000) are particularly important to maintaining tax exempt
status with the IRS.

The Foundation is committed to complying with the laws regulating
charities and charitable donations in all 50 states of the United
States.  Compliance requirements are not uniform and it takes a
considerable effort, much paperwork and many fees to meet and keep up
with these requirements.  We do not solicit donations in locations
where we have not received written confirmation of compliance.  To
SEND DONATIONS or determine the status of compliance for any
particular state visit https://pglaf.org

While we cannot and do not solicit contributions from states where we
have not met the solicitation requirements, we know of no prohibition
against accepting unsolicited donations from donors in such states who
approach us with offers to donate.

International donations are gratefully accepted, but we cannot make
any statements concerning tax treatment of donations received from
outside the United States.  U.S. laws alone swamp our small staff.

Please check the Project Gutenberg Web pages for current donation
methods and addresses.  Donations are accepted in a number of other
ways including including checks, online payments and credit card
donations.  To donate, please visit: https://pglaf.org/donate


Section 5.  General Information About Project Gutenberg-tm electronic
works.

Professor Michael S. Hart was the originator of the Project Gutenberg-tm
concept of a library of electronic works that could be freely shared
with anyone.  For thirty years, he produced and distributed Project
Gutenberg-tm eBooks with only a loose network of volunteer support.


Project Gutenberg-tm eBooks are often created from several printed
editions, all of which are confirmed as Public Domain in the U.S.
unless a copyright notice is included.  Thus, we do not necessarily
keep eBooks in compliance with any particular paper edition.


Most people start at our Web site which has the main PG search facility:

     https://www.gutenberg.org

This Web site includes information about Project Gutenberg-tm,
including how to make donations to the Project Gutenberg Literary
Archive Foundation, how to help produce our new eBooks, and how to
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