The Project Gutenberg EBook of Sermão contra o Filosofismo do Seculo XIX, by José Agostinho de Macedo This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.org Title: Sermão contra o Filosofismo do Seculo XIX Author: José Agostinho de Macedo Release Date: July 24, 2010 [EBook #33245] Language: Portuguese *** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK SERMÃO CONTRA O FILOSOFISMO *** Produced by Pedro Saborano SERMÃO CONTRA O FILOSOFISMO DO SECULO XIX.º, PRÉGADO NA IGREJA DE S. JULIÃO DE LISBOA NA QUINTA DOMINGA DE QUARESMA DO ANNO DE M. DCCC. XI. POR JOSÉ AGOSTINHO DE MACEDO, _Prégador do Principe Regente Nosso Senhor._ LISBOA, NA IMPRESSÃO REGIA. 1811. _Com licença._ * * * * * _Vende-se na loja de Desiderio Marques Leão, ao Calhariz, N. 12._ ADVERTENCIA. Não he muito proprio de hum Sermão hum Prologo, mas os ataques reiterados dos meus gratuitos inimigos me tem obrigado a prevenir o Publico em qualquer composição minha, ainda que seja de puro divertimento, e he muito mais indispensavel huma preliminar advertencia em composição tão séria como he este Sermão, no qual faço triunfar a Religião dos ataques do moderno Filosofismo. E para compôr este Discurso, seria licito ler alguma coiza! Parece que sim, e que sem hum profundo conhecimento dos escritos dos Apologistas da Religião Christã não poderia nem levantar a fiança do presente edificio. Certos estouvados se atrevêrão a lançar-me em rosto, que roubava Antonio Vieira para compor meus Sermões. Ora pois abatamos este importuno Fantasma de Vieira, e rebatamos esta livre calumnia, e dita por quem nem leo Vieira, e só ouvio dizer que Raynal fallára de hum Sermão deste Jesuita pelo bom successo de nossas armas contra as de Hollanda. Saibão pois que eu, que componho hum Sermão como o presente, não necessito de Vieira, que não tem hum só discurso, onde se ache huma instrucção christã, e que o desprezei com todo o meu coração depois que li o principio de hum Sermão de Mandato prégado na Capella Real no anno de 1655, e neste principio estas escandalosas palavras==Tomo 4. pag. 358. § 379. col. 2. regra 4.: _Este cavallo branco he a sagrada Humanidade de Christo._==Nunca mais o detestavel Vieira. Ora como até nos doirados domicilios da crapula, e ociosidade, onde a libertinagem ousa levantar a voz contra a Religião, torpissimos ignorantes fallão de Sermões, e dos meus Sermões, saibão estes Gazetaes eruditos, que para compôr este gravissimo Discurso eu li, e estudei. 1. S. Gregorio Nazianzeno, _Orat. cont. Jul._ 2. S. Fulgencio, _De Fide ad Pet._ 3. S. Cyrillo, _Cath. cont. Juli._ 4. O Cardeal Gerdil, _Impug. do Emilio._ O mesmo, _Introducção ao estudo da Religião._ 5. Mazoti, _Discursos contra a cred._, T. 2. 6. Vascelchi, _Provas do Christ._ 7. Roberti sobre a leitura dos Liv. de _Methafysica_. O mesmo, _Impugnação do Livro La Predication_. Não posso ser mais ingenuo: estas são as fontes: o Discurso he meu, as provas dos santissimos, e doctissimos Mestres do Christianismo. SERMÃO CONTRA O FILOSOFISMO DO SECULO XIX. _In malevolam animam non intraibit Sapientia._ Sap. Cap. I. Não ha, nem póde haver coiza mais aborrecivel, e mais detestavel aos olhos da boa razão, que a entonada soberba de hum malevolo ignorante. O homem sisudo não póde olhar sem indignação para essa interminavel cohorte dos que neste seculo se dizem livres pensadores, quando contempla o soberbo, e ultrajante gesto, ou amargo surrizo com que elles olhão para o homem de bem, que fiel a seus principios, e consequente em sua crença, e conducta, respeita sua Religião, e a reconhece divina em sua fonte, e sua origem. Deste rizo, e deste soberbissimo signal de huma ultrajante compaixão, quantas vezes tenho eu sido testemunha, e tambem objecto no meio desta Capital! Eu julgava que apenas aconteceria isto no meio das praças da nova, e mais prostituida Babylonia, mas eu o vi realizado tambem em Lisboa. Se o medo, e o terror de hum justo castigo continha, e exteriormente refreava estes estólidos motejadores no centro de hum Governo Catholico, e vigilante, elles deixárão cahir de todo a máscara, e mostrárão sem pejo a impudentissima face em quanto sentimos o ferreo jugo do cáos revolucionario, que nos invadio, e tyrannizou por nove continuos mezes. Então, então esses malevolos academicos do segredo, e das visagens, imaginando, vertiginosos e illusos, que havião levantado, e firmado o estandarte de sua nem realizada, nem possivel liberdade, insultárão os verdadeiros fieis, e os taxárão de fraqueza, e pusillanimidade, e os titulos menos affrontosos que lhes davão, erão os de fanáticos, crédulos, e supersticiosos. E quem serião estes miseraveis entusiastas? Por ventura alguns Celsos, Jamblicos, ou Profirios doctos, e profundos Filosofos successores em Athenas, e Alexandria daquelles famosissimos oraculos do Epicurcismo, e Platonismo? Algum daquelles que apoiados com a incredulidade, e poder de hum Imperante como Julianno pertenderão com seus escriptos, e doctrina solapar os alicerces do nascente Christianismo? Seria honrar, e desvanecer excessivamenre estes átomos de sabedoria, se eu os comparasse a tão formidaveis, e terriveis talentos da antiguidade. São verdadeiramente huns átomos, e perdidos no espaço immenso dos malévolos; huns obscuros adeptos do Illuminismo cobertos agora de hum ridiculo eterno com os contrarios effeitos daquellas a que elles chamavão profundas theorias de moral, e de politica: esmagados agora debaixo do pezo das vergonhosas derrotas do monstro em que confiavão, e que por certo ignora sua existencia, e do qual não podião, como a experiencia lhes diz, esperar mais que opprobrios, ferros, escravidão, e morte. Huns famintos, mas vaidosos mendigos, que esperavão entrar na divisão da preza dos sanguinarios Tigres, cuja avidade, e cobiça insaciavel até se rouba a si mesma para se saborear no roubo, e não haver intervallo neste seu natural exercicio: huns ociosos perennes, que nesses asilos da embriaguez se asoalhão a si mesmos por fortissimos espiritos, e não deixão a bocas alheias a trombeta de sua fama, e do renome de seus relevantes, e sublimissimos engenhos, homens finalmente, que sem mais estudo, sem mais Universidade, sem mais applicação, sem mais livros que o Monitor, sem mais academias que as conferencias das trévas nos subterraneos da crápula, e das enigmaticas, e symbolicas ferramentas, ousão clamar, que nós os verdadeiros fieis, acreditando, e respeitando nossos santos, e adoraveis dogmas, não fazemos de nossa natural razão aquelle uso que podiamos, e que deviamos fazer. Que dando-nos a Natureza olhos para ver, desgraçada, e voluntariamente nos fazemos cégos; e que querendo ser humildes, e obsequiosos crentes, nos tornamos pessimos raciocinadores, que a nossa crença faz resvalar a dignidade do ente pensador para a classe do bruto, que deshonra a humanidade, sepulta, ou estraga o mais precioso talento que nos déra o Creador, que vergonhosamente nos classificamos abaixo dos animaes rudes, acima de cuja esféra estavamos constituidos pelas faculdades intellectuaes. Eis-aqui o que eu mesmo escutei, o que eu mesmo soffri; e ouvindo discorrer tanto a estes livres pensadores, nunca pude arrancar de suas eloquentissimas linguas a causa, e o motivo desta tão filosofica accusação. Mas estas idéas ôccas expostas em sesquipedais expressões, que parecem destiladas pelo vagaroso, e enfatico intervallo que ha entre huma, e outra, e apoiadas com os estrondosos nomes de Raynal, Voltaire, e Helvecio, e proferidas diante da juventude inconsiderada, ociosa, e irreflexiva, obrigão a se formar de nós aquelle conceito, que se forma de hum rebanho de animaes brutos, e estupidos que se despenhão, e precipitão cégos por aquelles combros por onde vêm arrojar-se o primeiro, ou por onde os chama o silvo de hum pastor, ou a sombra de huma vara. Aquelles que assim nos tratão, e insultão são acclamados, e tidos em conta de espiritos pensadores, amigos do bom siso, e defensores da verdade, e até redemptores da oppressa razão, que sabem magistralmente purgar-se a si, e aos outros de preoccupações defendendo-os dos ataques da ignorancia, do fanatismo, e infantil credulidade. Não sei, Senhores, se podereis ter ouvido em paz, e sem se vos desprender o fogo da ira, e da indignação, coizas tão vis, e tão affrontosas; mas socegai, que talvez seja este o dia do triunfo mais illustre da nossa Fé contra o Filosofismo do Seculo XIX. Eu vos amo, prezo, e respeito tanto como a verdade, e discorrerei de maneira que empenhe todas as forças da razão, e da eloquencia, e farei que tão escandalosas vilanias se não digão mais, ou se não digão impunemente aos verdadeiros fieis. Mas porque caminho dirigirei eu os passos do entendimento a esta baliza? Os apologistas da Religião nada tem até agora omittido: são conhecidos seus escriptos. Holland, e Valceschi respondêrão a Mirabaud, Bergier a Freret, Abbadie, e Hautevile a Wolaston. A Celso respondeo Origenes, a Juliano S. Cyrillo, a Profirio o maior de todos os Oradores, Nazianzeno: eu responderei a todos. Os modernos Incredulos não são mais que serviz, e miseraveis éccos destes antigos sofistas: e crêde que tem mais pezo, e força hum fragmento de Profirio, ou de Celso, que toda a supposta, formidavel artilharia encyclopedista: e hum Occelo, e hum Timeo mais que o confusissimo systema da Natureza. Estando pois todas as varedas batidas, e todos os meios empregados, eu não posso dizer-vos que seguirei hum caminho novo, seguirei o mais plano, obvio, e descoberto, e que possa ser pizado até pelos entendimentos menos agudos, e penetrantes sem o afan de profundas especulações. Eu confrontarei o uso ou emprego da razão natural, que fazem os verdadeiros fieis com o uso, e emprego, que da mesma razão fazem os incredulos. Constituirei de huma parte estes estrondosissimos panegyristas, e redemptores da razão, que segundo elles dizem, e assoalhão, lhes serve para ver, e conhecer todas as coizas sem ter necessidade da Fé, e que desprezão, ou regeitão magistralmente tudo o que ou não comprehendem, ou não vêm com a mesma razão. D'outra parte constituirei os verdadeiros crentes os mais rendidos, e sugeitos ás suas decisões, e mais apartados do espirito de duvida: e comparando, ou confrontando hum com outro partido, fazendo entrar em fechado campo os humildes, e simplices crentes com os soberbissimos e eruditissimos Sofistas como víra o vale de Therebintho de huma parte hum Gigante, e d'outra parte num joven pastor, farei ver, e conhecer victoriosamente a qual dos dois convenha o brazão e o timbre de fazer uso, e o melhor uso das faculdades intellectuaes, qual dos dois honre, ou qual avilte a razão, e a humanidade, e qual dos dois mereça a compaixão como enganado, e obtuso, qual seja digno de louvor como atilado, e consequente. Conheço, Senhores, que a vantagem está da nossa parte, e que se tornará evidentissima com o meu Discurso, e tambem conheço que assim como os mysteriosos das vizagens, e dos signaes da esquadria se obstinão em planos de profunda tactica e politica sublime para igualizar, republicanizar, domocratizar, e fraternizar o Mundo depois que elles mesmos, e não outros, o encadeárão aos pés do monstruoso despotismo de hum obscuro aventureiro, sem que se envergonhem nem do mesmo ridiculo de que estão cobertos; tambem para se vingarem da verdade que lhes dér nos olhos, se obstinarão ainda mais na impostura, e no engano. Se algum destes miseraveis existe no meio deste immenso auditorio, e se tem trazido para aqui o compasso para medir o que não entende, esperando escutar as frazes do neologismo de seus ridiculos periodicos, eu lhe peço, que se digne hum pouco de desfranzir as arqueadas filosoficas sobrancelhas, e ouvir por hum instante hum Christão desapaixonadamente, e desenganar-se-ha, que só no seio do Christianismo, e no regaço da Fé se acha o Orador sublime, o Filosofo profundo, e o homem da razão, e da verdade. DISCURSO. Dizem pois os mysteriosos censores, e não tem jámais deixado de o repetir o mais insignificante folheto da escola tenebrosa, que nós os Christãos nem fazemos, nem queremos fazer uso de nossa razão natural; que quando se trata dos mysterios da Religião, accreditamos, e emudecemos; que não damos conta aos outros homens dos motivos da nossa fé; que conservamos como encadeadas as faculdades racionaes, e intellectuaes sem entrarmos no conhecimento analytico destes mesmos motivos. Tal he a primeira calumnia, que envolta em rebombantes periodos, sahio do famoso Club de Holbac, e havia de muitos annos antes apparecido no impio Livro _O Militar Filosofo_; tal he o primeiro improperio que vem na vanguarda dos impugnadores, e refutadores analyticos da verdade da Religião Christã. Tal he o principio puerilmente rebatido até ao enjôo, em tantos livros de identica substancia, de identica doctrina, e até de titulos identicos, e que já desafião a irrisão do homem sisudo, vendo que aquellas cégas, e tenebrosas Toupeiras não sabem mais que hum caminho subterraneo; _Systema da Natureza_; _Filosofia da Natureza_; _A Natureza_; _Religião da Natureza_; _Codigo da Natureza_; _Moral da Natureza_. Tal he o grande achado com que se esmaltão os noventa e nove volumes do palavrosissimo Sofista de Fresney. A estes malevolos oraculos, em que não cabe a sabedoria, eu poderia já dizer as mesmas palavras que o Martyr Luciano disse em Antiochia ao soberbo Proconsul: Sabe, que nós os Christãos não nos dirigimos, e levamos como tu julgas por huma indisputada, e paternal tradição como fazem os teus Filosofos. Deos he o Auctor da nossa crença, e Deos nos falla de Deos. (Euseb. Hist. Eccl. Liv. 9. c. 6.) Isto poderia fazer emudecer os monstros, mas comecemos de mais longe. Sabei, ou não o affecteis ignorar, que os primeiros annunciadores do Evangelho, tiverão á frente dentro em Jerusalem os mesmos Hebreos incredulos, e pertinacissimos, e que a estes mesmos Hebreos se disse, e se provou, que o alimento da nova crença em o Christianismo era muito racionavel. Sabei, ou não o affecteis ignorar, que o mesmo Apostolo, que havia sido perseguidor, fallara ao Areopago de Athenas, e aos Filosofos de Roma, e que dissera, que o obsequio, que nosso entendimenio fazia á Fé, era muito racionavel. Por ventura o Areopago de Athenas, celebradissimo por sua sabedoria, e prudencia, e as Academias da douta Grecia, e soberbissima Roma erão ajuntamentos de gente escolhida, ou capaz de se deixar embair de admiração pela doctrina de Paulo, e de abraçar sem escrupuloso exame, e sem huma muito filosofica discussão os elevadissimos mysterios, que elle lhe propunha? Que injustiça he esta dos fataes encyclopedistas, e seus adeptos, cujas ramificações se estendem tanto pelos domicilios da crápula, e politica desta Capital! Porque alguns humildes idiotas, e medrosos dos astutos, e capciosos sofismas emudecem aos altisonantes nomes de Pitaval, e Raynal, ou dizem simplesmente que accreditão, fazer commum a todos, e até a mim, esta linguagem, constituindo de seu plenissimo poder ao som de altas punhadas nas marmoreas bancas huma enorme distancia, e huma irreconciliavel inimizade entre o discorrer, e o accreditar! E se eu vos fizer ver, oh malevolos, e incapazes da luz da verdadeira Filosofia, que nenhum dos Filosofos antigos, e modernos fez tanto uso da natural razão em seus principios, e opiniões, quanto faz em sua Religião hum verdadeiro crente? E se pelo contrario eu vos mostrar com evidencia que não existe hum individuo, que menos empregue a razão, ou que a empregue mais despropositadamente que hum incredulo do estupido rebanho dos fortes pensadores? Eu já poderia cortar de hum golpe a grande questão, constituindo-vos diante dos olhos a pueril differença dos innovadores em materias puramente Filosoficas, e perguntar-vos se he mais chegado á razão o systema de Taliamed, ou o de Delisle sobre a formacão do Universo, e producção das creaturas, se a cosmogonia de Moisés? Se he mais conforme aos dictames da razão natural o systema de Buffon, que pertende, que huma pancada dada por hum Cometa no corpo do Sol, das lascas que saltárão se fizerão todos os globos que em torno delle girão com tão compassados, e Regulares movimentos, se a creação do mesmo Sol, e dos astros pela voz de hum Deos Omnipotente como nos declara Moysés? Mas deixemos por agora esta confrontação de objectos particulares para procedermos com methodo em materia de tanto momento, e consequencia; e conheceremos quaes sejão os cégos, e os inconsequentes. Eu me persuado que estes zelosissimos Apostolos da razão não são tão encarniçados inimigos da crença Christã, que em odio da mesma crença queirão abolir, e exterminar de todo a mesma fé humana; nem se poderia entrar em argumento com estes filosofantes, se negassem este primeiro, e evidente principio: e tambem me persuado, que se não póde imaginar num homem nem mais irracionavel, nem mais infeliz do que aquelle, que vivesse com o firme presuposto de não dar jámais credito a outro homem, que falle, ou escreva, salvo se sua escritura, e suas palavras não forem immediatamente apoiadas com o actual, e perenne testemunho dos sentidos. E se he bom uso, segundo lhes oiço dizer, aquelle que se faz da razão humana accreditando os homens que fallão, ou escrevem, julgo, que não dirão, que he mao uso aquelle, que se faz da razão accreditando a Deos. Eu creio, que este será chamado por elles mesmos o uso mais perfeito, mais excellente que se possa fazer da faculdade racional, pois vêm, que assim discorrêrão, e praticárão não os idiotas, e simplices crentes, mas hum Newton, hum Locke, e hum Pascal. Sim, dizem os mysteriosos, ou ridiculos iniciados, se esse Deos existe, e, se acaso existindo, esse Deos fallou... Não se dêm tanta pressa, Senhores, eu sei que até esses limites chega toda a sua subterranea, tenebrosa, e escondida illuminação. Trataremos ainda destes dois grandes objectos, por agora bastará ver, que se os pensadores fortes acreditão mais os homens que Deos, e se nós acreditamos mais Deos, que os homens, temos da nossa parte huma incomparavel vantagem, e igual áquella que tem hum homem de bom siso sobre hum varrido mentecapto. Creio, que esta duvida dos mysterioros umbriferos sobre a demonstrada existencia de Deos, he huma especie de espantalho, que me tem querido pôr, pois o mais superlativo Veneravel, e o do mais empinado cabeço do Libano, sabe muito bem, que hum verdadeiro Atheismo depois de se haver sofisticado tanto, ao menos para o estabelecer como provavel, em os dois confusos volumes do inintelligivel Systema da Natureza, segundo a confissão até do mesmo Vanini, e Spinosa, he hum verdadeiro delirio. He justo, que os Senhores politicos tenebrosos procedão, e argumentem de boa fé, e que não sáião de suas trincheiras, que são as do Deismo, e não as do Atheismo, e presuposta a verdade que elles absolutamente se não atrevem a negar, que existe hum Deos, cujas provas _a priori_ até agora não tentadas, eu produzirei bem depressa em hum Tratado particular, para consolação da razão humana; eu me não devo obrigar agora a outra demonstração mais, que á demonstração de ter fallado aos homens. E quantas vezes, e de quantas maneiras tem elle fallado destes dogmas, que nós accreditamos, e desta Religião, que sós professamos? Por que meios tão maravilhosos, tão estupendos não tem elle annunciado aos mortaes seus profundos mysterios, as Leis, e os Decretos de sua immortal vontade? Fallou primeiro muitos seculos antes pela lingua, e pela penna de alguns homens, que tão exactamente annunciárão, e descrevêrão os futuros acontecimentos desta Religião, e do seu Auctor, bem como os mais imparciaes, e fieis Historiografos descrevem os factos presentes, ou á pouco acontecidos debaixo de seus mesmos olhos: e estes futuros acontecimentos pontualmente verificados, além de seres contingentes, erão destituidos, (conforme a capacidade do entendimento humano) de toda a apparencia, e probabilidade de se verificarem: oppostos a todos os raciocinios, a todas as conjecturas humanas, a todo o systema dos tempos em que se escrevêrão; e além disto repugnantes entre si, como são repugnantes, e apparecem contradictorios em huma mesma personagem, em hum mesmo culto; pobreza, e grandeza; exaltação, e ignominia; throno, e patibulo; desterros, e conquistas; estragos, e multiplicação; perseguições, e victorias. Fallou em segundo lugar, pela boca de seu mesmo Filho, pondo por elle fim evidentissimamente á primeira alliança, e juntamente ao Altar, ao Sacerdocio, e ao Principado de huma lei figurativa, e só permanente antes da realidade: e dando principio nelle, e por elle á nova alliança, conductora de verdadeiras bençãos a todas as Nações, conforme os clarissimos vaticinios de todos os Profetas. Fallou com á voz de huma grande parte do Mundo, que passou rapidissimamente do culto idólatra, que era a Religião dominante, e quasi universal á crença Christã; dos encantadores deleites á temperança Evangelica; das soberbas riquezas á desprezivel pobreza; do ambicioso commando á humilde sugeição, bastando doze homens simplices, e ignorados para fazerem esta moral revolução por toda a parte do immenso Imperio Romano. Fallou com a voz de huma grande multidão de homens literatos do Gentilismo, que conhecendo, sentindo, e admirando a santidade desta Religião, e a sublimidade destas doctrinas, julgárão huma rematada loucura sua antiga sapiencia, e se tornárão como hum Justino, de Filosofos Pagãos em Theologos, e Mestres do Christianismo. Fallou finalmente com o sangue de hum numero portentoso de Martyres, cuja constancia acompanhada sempre de hum silencioso, e pacifico soffrimento excede todas as forças da humana natureza, nem cabe nos confins da humana Filosofia. Agora eu vos pergunto, ó espiritos incredulos, ó mysteriosos pensadores, grandes columnas dos Liceos centraes, e dos Printaneos universaes, ó eruditos profundos em Monitor, e mais nada; ó estupidos sequazes do Filosofismo Wandalico, e revolucionario, quem vos tem fallado, quem vos tem feito pensar, e crêr cousas contrarias aos principios, e dictames desta minha fé, na qual se observa, e se escuta manifestamente a palavra de hum Deos, que fallou aos homens? Nós somos iguaes nisto só: _Eu creio, vós accreditais_. Porém nós somos differentes nos motivos, nos auctores, nos testemunhos, eu, da minha crença, vós da vossa incredulidade, e futilissimas duvidas. Dizei-me pois, quem sejão aquelles que vos tem fallado de viva voz, ou por escripura? Ah! vós vos correis, e envergonhais de os nomear! Tambem eu me envergonho, e corro de proferir seu nome, para que não julgue, ou se não persuada algum idiota dos doirados crapulosos domicilios de Lisboa, que eu me digne de instituir huma confrontação entre os vossos mestres de Fé, e os meus. Seria fazer o mais injurioso parallelo nomear Freret, Boulanger, Diderot, e d'Alembert, e depois os mais sublimes Profetas, e os Santos, e doutissimos Mestres do Christianismo, ainda no seu berço, como hum Origenes, hum Athanazio, hum Tertuliano, e hum sublimissimo Nazianzeno. Direi sómente em geral, que estes Coriféos, Enciclopedistas, e Oraculos do Filosofismo são crentes de propria invenção, e mestres de proprio moto, trepados em pestilenciaes cadeiras, mestres sempre fluctuantes, sempre incertos, sempre discordantes entre si, sempre contradictorios comsigo mesmo como hum Jaques, que em huma pagina exalta o Evangelho como huma producão divina, e logo n'outra pagina o deprime como num parto da simplicidade, e do Fanatismo: mestres, que se da sua crença ou de seus sofismaticos escritos dependesse o mais pequeno, e o mais insignificante negocio domestico de seus discipulos, ou alguma de suas terrenas vantagens, ou fico que a todos os de sua escola pareceria summa imprudencia fazer-se incredulos sobre a sua honrada, e scientifica palavra. Mas não he este o lugar para esta discussão, he tempo sim de confrontar uso de razão com uso de razão, o uso que eu faço com o uso que vós fazeis, ou vos considerei como discipulos, ou vos assoalheis como irmãos terriveis, e veneraveis: e se esta disputa terminar em desvantagem vossa, sereis obrigados a confessar racionavel a minha fé, depois que tantas vezes a tendes escarnecido, e me tendes provocado, e até reprehendido como rebelde ao bom sizo, como desprovido de razão, e até ingrato á humanidade. E porque? Oição este porque os Povos mais selvagens, e incultos da terra, e digão senão he nova até entre elles tanta extravagancia, e tanta brutalidade! Porque a despeito de hum arbitrario fabricador de systemas, de hum arguto, e sagaz filosofante, de hum fantastico pensador, tenho dado credito, e o dou ao Supremo Ser, á Suprema, e primeira verdade, que fallou em todos os Seculos, que fallou em todas as lingoas, que fallou em sua propria pessoa, ensinando-nos por si mesmo dogmas unidos, e ligados entre si com hum laço maravilhoso, e, se nem todos são accessiveis ao entendimento humano, são todos conformes aos dictames da recta, e natural razão. O que acabo de dizer, que a minha fé, e a minha crença tem alguns artigos que parecem inacessiveis ao entendimento, humano desabafa alguma cousa meus implacaveis accusadores da consternação, e aperto em que os lançou a primeira parte da indicada confrontação: porque, se he verdade, dizem elles, como eu confesso, que a Religião tem alguns dogmas não perceptiveis ao entendimento humano, eis-aqui porque eu Christão, a respeito dos mysterios da Fé, sou obrigado a renunciar o lume da razão natural: em quanto nós... Em quanto vós, oh! Pitavais, oh! Rainais! sois obrigados a renunciar o lume da razão natural a respeito dos mysterios da Natureza. Esta minha resposta assim vibrada, talvez seja pouco sucosa, e muito restricta, he preciso que eu a exponha com mais perspicuidade, e extensão. Assim como he hum indispensavel dever do homem pensar segundo a razão natural, tambem he hum dever indispensavel do mesmo homem conhecer os confins, ou as balizas que a Natureza constituio a esta razão; e ainda que exacta, e precisamente se não possão determinar quaes sejão estas balizas, conhece-se com tudo que existem muito á quem das cousas invesiveis, e imateriaes. E que conta se dá a si mesma esta tão orgulhosa razão das cousas corporeas hum pouco superiores, ou distantes dos nossos sentidos? Que conta se dá daquellas mesmas cousas que temos entre as mãos, e que com o olho armado de lentes subtilissimas examinamos todos os dias? Que razão nós damos do movimento de hum insecto, da sobida de huma lavareda, da tendencia de huma pedra para o centro da gravidade, da respiração de hum animal, do fenomeno regular do fluxo, e do refluxo, da causa immediata do magnetismo, dos espantosos effeitos da electricidade, das fases da lua, da marcha excentrica, e irregular de hum Cometa, do movimento de hum Planeta, da sua acceleração na razão inversa do quadrado da distancia ao centro da revolução? E quem seria tão desasisado que em lugar de confessar limitada a sua razão, negasse pertinazmente a existencia destes objectos porque os não comprehende? Que conceito formariamos daquelle profundo pensador, que porque os não entendia os julgasse, e reputasse a todos outras tantas imaginações sem fundamento, ou outras tantas illusões da fantazia, e dos sentidos? Não se dirá de hum menino, que tocasse apenas o septimo anno de sua idade, que não usa da sua razão, e que injuria a Natureza que lha communicou, porque senão levanta com o entendimento a especular os mysterios, e a resolver os problemas da mais recondita Filosofia? Dir-se-ha com verdade, que considerando a molleza de suas fibras, e a immaturidade de seus orgãos, estes pensamentos altos, e estas profundas especulações não são ainda para elle, e que muito faz, attendida a sua idade, se se adianta hum pouco em o material conhecimento das letras, e em huma superficial combinação das syllabas. E se este menino por não poder penetrar, e conceber sciencias maiores que estes seus primeiros rudimentos da leitura, negasse que existião mais sciencias, e mais reconditos conhecimentos das causas, e dos effeitos, todos se ririão, e lhe não darião o nome de louco em attenção á sua muito tenra, e delicada idade. Direis que eu discorro com clareza, mas he porque se trata de huma razão tenra, e noviça, mas que o argumento não tem força onde se trata de huma razão perfeita, e chegada á sua devida maturidade. Seja embora a razão madura, e perfeita, dizei-me póde ella acaso transgredir seus naturaes limites? Póde acaso deixar de ser razão anuviada do sentido material, e céga para todos os objectos que não forem corporeos? E não são próvas desta verdade alguns incredulos escarnecido por vós mesmos, por terem a affirmado como Mirabaud, que nada mais existe em o Universo, que corpo, e materia: ou por haverem affirmado que esta materia he Deos, que esta materia he a Providencia, que esta materia he aquella immaterial substancia, Arbitro supremo, e separado da Natureza, que eu, simples, temo, e adoro como hum ser infinito, de ordem superior, e todo espiritual? Lembrai-vos, que he identico o vosso caso, e o do tenro menino, que porque não tem entendimento capaz de formar idéas mais sublimes, cuida que toda a sciencia humana consista em saber contar hum pouco melhor, e em combinar com mais facilidade algumas syllabas materiaes. Torno outra vez ao campo com as empunhadas armas do parallelo, e vos peço, que me digais se acaso seja honrar a humanidade, ou pizalla, e desprezalla furiosamente depois de ter com mil provas conhecido a limitada capacidade da razão, até no conhecimento, e analyse das cousas sensiveis, que são de sua immediata jurisdicção, atrribuir-lhe tanto dominio, e dar-lhe huma vista tão aguda, e penetrante, que nem das cousas invesiveis, nem da Natureza Divina, nem das Divinas operações, se não deva acreditar, nem mais, nem menos, senão aquillo que a mesma razão póde comprehender, e isto com tanta segurança ensinado pelos Veneraveis aos adeptos dos primeiros gráos, ou dos primeiros momos, ou visagens, que quem pensar d'outra maneira se deva logo constituir á carga cerrada na classe dos brutos animaes, desprovidos de razão, e de conhecimento. E he isto conhecer, como he de obrigacão de todo o mortal raciocinante, os limites do entendimento humano, e do humano discurso? Em que direis vós que estes Veneraveis, ridiculamente mitrados, annunciando enfaticos o ramo d'Acacia, e que a carne deixa os ossos, se distinguem de hum insensato, que com azas postiças presuma levantar o vôo, e girar em torno das orbitas dos Planetas? Porém os crentes não fechão voluntariamente os olhos da razão? Não se immergem voluntariamente nas trévas da Fé? Vós aqui dissimulais com vossa costumada perfidia, e malicia ter visto a clara luz que eu vos mostrei na manifesta palavra de Deos, a cujo clarão inextinguivel nós caminhâmos, e confundis com hum de vossos ordinarios sofismas as trévas do entendimento com as trévas da razão: mas eu vos farei bem depressa conhecer quaes sejão, e a quem pertenção as primeiras, quaes sejão, e a quem pertenção as segundas. Trévas de entendimento são aquellas de que se vê rodeado nosso espirito, quando, por mais que investigue, e procure descortinar certos arcanos da Religião, não chega a conhecer, nem o seu modo, nem o seu fim, nem a sua causa: eis aqui aquelle abysmo insondavel á vista do qual bradava o Apostolo--_oh altitudo_! Mas isto são trévas necessarias a que podemos chamar sagradas sombras, em quanto se derivão, e se derramão da incomprehensivel Natureza do Ser Divino, e das Divinas operações, e por isto são trévas universaes para todos os entendimentos creados, são trévas para mim, e para os profundos pensadores; são sombras minhas, e sombras vossas por mais que vos chameis illuminados, nem são mais dos Egypcios, que dos Hebreos, nem mais dos Gregos, que dos Romanos, nem mais dos incredulos, que dos infieis, ou dos idolatras. Porém quando, ou por hum estranho orgulho não se queirão nem conhecer, nem confessar estas trévas, ou conhecendo-as, e confessando-as se fechão os olhos á luz da divina palavra, que torna firme a nossa fé no meio destas mesmas sombras, então as trévas que erão só do entendimento passão para a razão, e se tornão trevas voluntarias, e por isso trevas culpaveis, trevas deshonrosas, trevas de homem, que por ser pertinacissimo, renuncia os dictames da recta razão, e desce, e se faz semelhante aos mesmos brutos. Eu me magôo, e penalizo, oh espiritos incredulos, devendo dizer-vos que esta tão tenebrosa, e aviltada razão, he pontualmente a vossa, a tanto mais me penalizo quando mais conheço que vós quereis ser homens pensadores fóra do uso commum, e da vulgar esfera. Mas talvez que vos lembre alguma resposta, que vos livre ao menos em parte desta vergonhosa infamia. Pensai, estudai, meditai, consultai os vossos mais meditabundos Veneraveis, lê-de, e relê-de vossos amados livros, o vosso Tindal, o vosso Collins, o vosso Bolimbrocke, o vosso prezadissimo Oraculo de Fresney, vê-de se nesse erario de paralogismos podeis achar algum argumento, alguma palavra que vos possa destruir o vergonhoso labéo de serdes em materias de Fé homens desprovidos de razão. Eu mesmo, não posso encontrar, por mais que subtilize, huma só vereda por onde vos possaes escapar. Vós me concedesteis já, não o podeis negar, que existe Deos, vós tambem me deveis conceder que elle haja revelado aos homens o culto com que quiz ser adorado pelos mesmos homens, que o revelou, e manifestou de huma maneira descoberra, e sensivel, milagrosa em cada huma de suas circumstancias que este culto, para ser digno delle, devia conter verdades superiores á esfera do humano entendimento, e que de outro lado este humano entendimento he tão pouco penetrante, que não póde presumir sem loucura que conhece, e entende todas as verdades fysicas, e naturaes. E porque estes Dogmas da Fé se envolvem em magestosas sombras, e sagrada obscuridade, vós recusaes acredita-los sem que se vos torne evidente sua possibilidade, ordem, e economia; e nós os fieis que os acreditâmos sem tão filosoficas delicadezas somos tratados por vós, profundissimos pensadores, e accreditadores das verdades, do Monitor, de estupidos inimigos do bom siso, e de pessimos raciocinantes. Nós, continuão os Veneraveis a clamar, não dizemos que vós sois pessimos racionantes, dizemos sómente que conservaes em estupido ocio a razão, e o discurso. Isto he huma retirada que eu não podia esperar, mas esta mesma retirada não os salva de serem seguidos, e feridos com as armas da razão. Dizem pois, que eu por ser crente, sou constrangido a conservar em ocio vituperoso o discurso humano, sepultando o maior talento, ou dom da Natureza, que he o lume da razão. Grande Deos! E era de esperar isto de homens que tem olhos para ver, e razão para discorrer! E era de esperar huma semelhante impostura? Entrai oh incredulos, em alguma daquellas respeitavel Bibliothecas conservadoras, e depositarias da sapiencia Christã, e alongai a vista para o assombroso, e surprendente número daquelles volumes cheios de amplissimas provas da verdade da Religião Evangelica, e para que não digaes que constituo ante vossos olhos alguma Legenda crédula, algum Mistico a que chamais Visionario, lê-de unicamente Grocio, e Locke ambos defensores, ambos demonstradores da verdade do Christianismo, e de seus augustos Dogmas. Aqui achareis demonstrações luminosissimas, e levadas até a evidencia; os quaes os mais pertinazes das vossas nocturnas, e tenebrosas escolas não se atrevêrão ainda a responder, e os mais atrevidos não tiverão ainda outra resposta que dar mais do que vilipendios, e motejos plebeos: e quando tem querido dar resposta, como serios argumentantes, não tem feito mais que oppôr ás provas daquelles dois profundos Filosofos, fabulosas relações, Padres suppostos, Escrituras falsificadas, Authores suspeitos, e desacreditados, e se vós chamais ás provas do Christianismo fructos do ocio Christão, que chamarei eu a taes objecções, fructos da vossa pensadora incredulidade? A respeito pois da Essencia Divina, da sua immensidade, da sua immutabilidade, da sua eternidade, que tem imaginado de grande, e que descobrimento tem feito os vossos profundos pensadores, e os maiores oraculos do maior Oriente, para que se não creia em nossos pensadores Christãos? Tudo quanto disserão sobre a Natureza Divina os Socrates, os Platões, os Democritos, os Zenos, e outros Mestres pelo muito uso que fizerão da razão natural dignos de fama, e de memoria, he apenas hum balbuciamento de tenros meninos a respeito do que ensina o menos profundo dos Theologos Christãos, e o mais superficial, e insignificante dos nossos livros. A causa de tão grande differença entre uso de razão, e uso de razão, se vos dignaes escutalla o mesmo Evangelho a está declarando. De differente maneira edifica aquelle que escolhe para o edificio hum terreno compacto, e pedregoso, do que edifica aquelle, que escolhe hum terreno movediço, e solto; o primeiro não tem medo de levantar alto da terra o edificio que constroe, em quanto o segundo, attendida a natureza do terreno, se vê obrigado a conservar muito baixo o edificio, nem põe huma pedra sobre outra pedra sem receio de que crescendo o pezo cahia tudo confuso, e despedaçado sobre o infiel terreno. De similhante maneira acontece a hum entendimento, que tem fundamentado suas decisões sobre o firmissimo alicerce da sua Fé. Sobre estas bases se póde levantar com a razão, até ao solio do Immortal, para investigar a Essencia Divina, e as Divinas perfeições sem erro, e conhecer sem perigo cousas remotas, e distantes do entendimento humano. Pelo contrario os incredulos, e os Veneraveis que tanto me tem taxado de embecilidade, sem o fundamento da Fé, por pouco que se queirão levantar com a razão, devem sempre temer huma confusa ruina de caprichosos fantasmas, e vergonhosas contradicções. Ainda com o impeto, e força desta evidencia não emudecem os pertinacissimos impugnadores, ou refutadores analyticos: que ha que dizer (erguem elles animosamente a voz) que ha que dizer a estas nossas livres fantazias, ás quaes se dá o odioso nome de caprichosas! Por ventura, não são elas hum amplo patrimonio, hum direito innato do espirito humano? Custa-vos acaso, que nós os pensadores recusando crêr, nos conservemos na posse daquella liberdade de pensar que a Natureza nos deo, e que tanto tem dilatado os nossos Veneraveis, e da qual tão injustamente nos despoja a Fé? Ah! Illusos fraternizadores, e niveladores! E porque não dizeis, que tambem a Filosofia despoja o entendimento humano da liberdade de pensar? Quantos vôos de engenho he preciso refrear, quantos systemas he preciso regeitar, quantas invenções he preciso sacrificar, ás leis daquella, que segundo o vario gosto dos Seculos se chama boa, e razoavel Fysica? Vos que accusaes a Fé de ligar o entendimento, e de o condemnar a huma individa servidão, porque não accusaes tambem as Sciencias, que todas tem seus principios, suas regras, seus confins, que da mesma sorte que pratica a Fé, põem hum freio, e prescrevem leis ao licencioso entendimento? Com effeito, ou se considerem as sciencias, ou se considere a Fé, ou isto em vós he huma grosseira impostura, ou huma equivocação pueril, porque esta liberdade de pensar de que dizeis vos despoja a Fé, vós por certo a julgais, e a entendeis huma liberdade sabia, digna de hum homem racional, e não huma liberdade de fernetico, ou de hum sonhador febricitante. Ora dizei-me em que vos violenta, ou vos constrange esta Fé, cuja prepotencia vós tanto exageraes? Ella vos obriga a dizer que existe Deos, e esta existencia já está demonstrada pela razão natural. Ella vos obriga a confessar que este Deos existente fallára aos homens, e he evidente que elle fallou pelo exactissimo complemento dos vatecinios. Ella vos obriga a confessar, que as palavras deste Deos são infaliveis, e he inegavel que não podem deixar de ser infalliveis pois são de hum Deos que encerra em si todas as perfeições. Fóra disto eu não posso, nem he possivel descobrir cousa em que se constranja, ou tyrannize, como vós dizeis, a vossa liberdade; salvo se vos queixaes de perder aquella liberdade que quereis ter de ajuntar contradicções, de engrazar impossiveis, e de dar ao Mundo (como tendes feito em tantos Livros ineptos quantos ha desde o Militar Filosofo, até ás próvas do Mahometismo, ultima producção de Holbac,) quimericas imaginações por verdades demonstradas. Se quereis permanecer neste estado como vos prescreve o Codigo de Weishaupt, o de loucos varridos ainda he mais vantajoso. E, á vista disto, que estrepito se não tem feito, e se não continua ainda a fazer pelos subterraneos, que tremem da Policia vigilante, que os faz ir republicanizar, e igualizar em masmorras, sobre a miseravel escravidão do humano entendimento, e sobre o tyrannico imperio, que a Fé, segundo elles clamão, tem usurpado sobre a razão natural? Que queixas eu não tenho ouvido fazer sobre os pequenos progressos que tem feito no Mundo, depois da entrada do Christianismo a profana Litteratura? Que compaixão não fingem ter dos engenhos catholicos, que tendo azas com que poderião sobir acima das nuvens, se curvão, e encolhem ao jugo da crença, abatendo os vôos, e andando quasi de rojo pela terra? Mas se se quizer examinar, ou vêr sómente que cousa seja este remontar-se sobre as nuvens, achar-se-ha que não he outra cousa mais que arrancar do entendimento (á força de pensar livremente) o innato conceito da honestidade, o innato horror do vicio, fazer das acções justas, e das acções injustas huma invenção do interesse, ou apenas huma das ceremonias da vida civíl, e da conducta politica; collocar, e estabelecer na força maior hum justo direito de roubar, e de matar seus similhantes; tirar das mãos aos Principes, e aos Dominantes a espada punidora de suas escandalosas maldades; e fundar toda obrigação que tem os homens de honrar, e obedecer a Deos, não em seu infinito merecimento, e em seu supremo dominio, mas unicamente em seu irresistivel poder. Eis-aqui, dizem elles, hum pensar livre, nobre, generoso, honrado, sublime, e não pensar com humildade, e sugeição de escravos, como fazem os Christãos. Eis-aqui o que se chama despregar soltamente as azas do entendimento, desferir com magestade os vôos como nos ensina o nosso Mestre Veissauph, e todos os nossos Cavalheiros do Libano, eis-aqui o que escutamos aos nossos Veneraveis, quando descalção as formidaveis, e tremendas luvas para nos fazerem vêr a luz em o ultimo dos nossos gráos, que vem a ser, ensinar-nos em Methafysica o Pantheismo, e em Moral, a Igualdade acephala, e anarquica. Eis-aqui o que se chama entranhar-se no conhecimento da verdade, e não querer a vida, se não para a empregar na indagação da verdade, sem levar sempre ao lado o cégo, e molestissimo pedagogo da crença sobrenatural. Eis-aqui o que nos inculcou, e o que nós estudamos nos mais que sobrehumanos escritos do nosso Cidadão Genebrino. Á vista disto, Senhores, eu creio, que ainda quando a Fé vo-lo não vedasse, vós não quererieis huma similhante liberdade de pensar, só para manter o decôro da vossa razão, e para não mostrar ao Mundo que constituis na extravagancia, e na loucura a gloria d'espirito forte, e pensador profundo. Resta pois que os valentes pensadores batão outro caminho que lhes possa lembrar, porque as veredas até agora tentadas os não tem conduzido, nem podem conduzir á sua tão vãmente preconizada victoria. Mas elles são de fecundo engenho, e fertil de estratagemas na guerra anti-christã; acolhem-se á sua ultima trincheira, conforme a tactica do guerreiro, ou campião de Genebra, que he a dos milagres que nós acreditamos como simplices, fundando nelles hum dos motivos da credibilidade da Fé. Milagres, que elles como sabios, e profundos pensadores desprezão, ou orgulhosamente desconhecem. Mas he preciso antes que venhamos ás mãos, que os meus inimigos mostrem boa fé em o seu ataque, e que se não tornem como costumão pessimos pensadores, escrevendo, e divulgando, não sem motejos, e improperios, que nós os fieis somos crédulos em tudo aquillo que se nos offerece prodigioso com tanto, que encerre em si alguma cousa de devoto, e de mistico. Mas eu os considero tão amestrados na Ecclesiastica Historia, que não ignorão oue os tempos de huma tão abusiva, e facil credulidade, ou não existírão na Igreja, ou se existirão em algum Seculo de decadencia, e dominação Gotica comprehendêrão em si hum pequeno numero de pessoas idiotas, e vulgares, fracções infinitezimas em o todo dos illustrados Christãos: elles não ignorão que a derramada luz da severa critica, da sagrada Hermeneutica, e das profundas indagações litterarias tem até destruido, e acabado a sua memoria. Além de que, esta crença dos milagres, exceptuando aquelles que estão registrados nas Santas Escrituras, não he entre nós crença divina, nem absoluta, nem sempre igual; he sim huma crença medida sempre pelo maior, ou menor valor da authoridade em que se firma. E á vista disto, quem póde taixar de aviltamento da razão o uso que nós fazemos do bom siso, a respeito dos acontecimentos milagrosos? Tem por ventura a Natureza ensinado aos homens outra regra de dar credito, ou de o negar ás mais estranhas, e inexperadas aventuras, mais que a qualidade, e o numero daquelles, que nos referem, e testemunhão extraordinarios acontecimentos? Dirão por acaso que usa rectamente de sua razão aquelle, que porque hum facto he milagroso, conta em nada a authoridade, a multidão, o caracter, as luzes das suas testemunhas oculares! Usa bem da razão, quem reputa ignorantes os homens mais doutos, os mais agudos, e penetrantes por insensatos, os mais prudentes por superficiaes, e os mais santos, e virtuosos por impostores?... Mas se os milagres são impossiveis, como he possivel que se acreditem? Tambem a vossa razão vos diz que os milagres são impossiveis? Oh entendimentos felizes! E podesteis desde as vossas tenebrosas, e nocturnas cavernas do mysterio, e das vizagens, sobir aos ceos, e tomar huma exacta medida das forças da Divindade, e, considerando, ou a subita vista de hum cégo, ou a ressurreição de hum morto dicidir magistralmente, que não chega a tanto o infinito poder do absoluto Arbitro da Natureza? Eu na verdade, não tenho medido palmo a palmo como vós fizesteis esta Divina Omnipotencia: todavia, parece cousa fóra de razão, que quem impôz as leis á Natureza, se haja elle mesmo feito escravo destas leis, com manifesta injuria de sua essencial, absoluta, e dispotica dominação. Mas se he preciso, oh grandes, oh profundos pensadores, tirar a Deos o poder absoluto de operar milagres, e considerar, e ter quantos se contão, ou de Moysés, ou dos Profetas, ou os de J. C. por outras tantas fabulosas invenções, então he preciso tambem negar todas as historias profanas, nenhuma das quaes tem por si a centesima parte daquellas próvas, que tornam autentica, e indubitavel a Historia Divina. Eu já começo, de sentir algum tedio, em rebater huma calumnia que talvez fosse ferir em reverberação com nula ignominia, que fructo, os escarnecedores, e motejadores da crença Christã. E agora que penso socegadamente me doe de não ter nesta contestação usado antes da doçura, que do rigor, para attrahir os incredulos: mas eu lhes supplico que se persuadão que este calor, e esta aspereza, que tem respirado o meu Discurso, não he culpa minha, mas se he licito dizello assim, he culpa da verdade. Esta verdade he branda de sua natureza, suave, e tranquilla, mas quando se vê impugnada, e atacada com audacia, e com injustiça, accende-se, inflamma-se em nobre ira, muda o sereno aspecto em carregado, e severo, veste-se de todas as armas, e toma huma lingoagem, ou tom, que faz sentir, a quem a ultraja, todo o seu incontrastavel valor. Com toda esta indignação pois, que he mais indignação da verdade, que indignação minha, creião que o meu coração os não póde escusar, ainda que deseje encontrar motivos de se Compadecer. Infelizes! Vivem em hum Mundo, e frequentão sociedades onde os serios, e verdadeiros pensadores, não são mui aplaudidos: de outro lado elles querem sobresahir ao vulgo, e parecer homens, ainda entre os doutos, d'hum pensar profundo. As materias de Religião lisongeão, ainda mais que as outras, seus menos regulados costumes, o pouco trabalho de huma superficial, e desatenta leitura os surte de breves sentenças, ou triviaes apothegmas, capazes de nutrirem a sua intereçada incredulidade, e de excitar a admiração dos idiotas. Entre estes apothegmas, eis-aqui o principal. Que a faculdade racional, he superflua nos Christãos, os quaes devem crer, e não discorrer, porque se discorressem, talvez não acreditassem. Mas o paralello, que fiz do nosso discorrer, com o discorrer dos incredulos, não terá dissipado todo o seu engano? Pézem os principios de que fazemos partir, nós a nossa crença, elles a sua incredulidade, e tenhão, não digo vergonha de si, e de sua scientifica soberba, mas tenhão dó da sua alma, que Deos pelos caminhos da razão tinha conduzido ao regaço da Fé. Confessem que se obstinão a pensar brutalmente, por huma soberbissima nauzea de pensar Christãmente. Que lhes fez J. C. para o não quererem acreditar como Mestre de huma doutrina celestial? Para que martyrisão perpetuamente seu espirito, e sua consciencia, contrastando a evidente santidade de seus Dogmas, a evidencia das Profecias que o annuncião, a evidencia dos factos que o comprovão, a evidencia dos milagres que o demonstrão? Basta. Juliano Apostata tinha sempre na boca a inraciocinabilidade que os incredulos nos oppõem, e dizia que em nós Christãos, tudo era crer. Porém o immortal Orador Nazianzeno lhe disse, e o confundio desta maneira (Orat. 1.ª Cont. Julianum) Podes tu, que tanto admiras, e amas tanto as Seitas Gentilicas, reprehender-nos a nós que fazemos esta honra, ou mais depressa esta justiça ao nosso Divino Mestre, e á sublimidade excellentissima, e inimitavel de seus dictames? Os teus amados Pytagoricos não tem por huma lei fundamental da sua escola, dever-se eximir das mais difficultosas questões que se lhes proponhão com aquelle seu decantado--Ipse dixit!--E nós porque não damos outra razão de nossos mysterios, mais que os ditos de hum Legislador conhecido com mil próvas por Divino, e infalivel, somos chamados por ti automatos insensatos, ou animaes sem entendimento? Esta he huma parte do tão gabado discurso dos incredulos desta idade, declarar-nos réos de aviltada, e desprezada razão, porque nos apoiamos em huma manifesta authoridade suprema: porém elles não tem na boca a toda a ora, mais que certos nomes, que, ou a audacia tem feito famosos, ou tornou célebres: a habilidade de vestir á moderna, e com estilo moderno as blasfemias antigas; como por exemplo--não he de crer que hum Deos, que he todo bondade, e misericordia haja de condemnar hum tão grande numero de creaturas, que vivem fóra da sua Igreja--(E porque as não ha de poder condemnar, achando que a sua infidelidade he culpavel!) Mas não se busquem tantos _porques_. Disse-o hum Sofista de París, ou de Genebra. _Ipse dixit_. Este Sofista he hum homem que tem em linha igual a momentanea lascivia, e a continencia Evangelica. He hum homem cujos incendiarios escritos forão lançados nas chamas pelos Decretos dos Tribunaes seculares, e vive em toda a terra infamado, e infame pela sua manifesta impiedade. _Ipse dixit_. He hum Tolland que diz que não ha lei que obrigue os homens a seguir a Religião revelada; e que seria Deos injusto se houvesse promulgado tal lei. E este Tolland arrastra-se em Londres de huma prizão para outra prizão, e morre foragido em o frio, e nebuloso inferno de Holanda; _Ipse dixit_. Este he o mestre alegado, acreditado, e seguido. Seja embora condemnado, e proscripto pelos Magistrados civís, he mestre _Ipse dixit_. Póde haver maior incoherencia; maior injustiça, que lançar-nos em rosto a nós o _ipse dixit_ de huma Authoridade Soberana, sustentada com tanta evidencia, e conservar para si, e querer que valha o _ipse dixit_ vacilante, e humano, e pronunciado por homens sem costumes, sem leis, sem patria, sem outra authoridade mais que a dos atavios ridiculos da Confraria das trévas, e dos subterraneos? Destruamos finalmente o ultimo sofisma destas almas malevolas, ou dissolvamos o ultimo laço de huma fraudolenta equivocação com que pertendem tapar os olhos aos simplices. Nós acreditamos os Mysterios, he verdade: a respeito dos Mysterios acreditados, tudo nos Christãos he crer, mas a respeito dos motivos de acreditar, tudo em os Christãos he vêr. Tudo he crer, a respeito dos Mysterios, porque estes sendo remotos dos sentidos, e superiores á razão humana, só podem ser objectos da crença: mas tudo he vêr a respeito dos motivos da crença, porque as provas da revelação destes Mysterios são tantas, e tão irresistiveis, que o espirito mais pertinaz não póde exigir outras maiores, e renovando outra vez a confrontação entre nós, e os incredulos, digo, que em nós, tudo he crer com summa razão aquillo que devemos crer, e nelles tudo he negar, sem razão alguma de negar, e com todas as razões de crer. Se destes principios innegaveis, sobre materias de Religião, eu desço a analysar o uso da razão que os mysteriosos, e tenebrosos fazem sobre materias de moral, e de politica, eu os descubro igualmente monstruosos, e inconsequentes. Assim como a incredulidade os conduz voluntariamente á sua eterna perdição, a mesma incredulidade os conduz á sua desgraça temporal. Todos os homens desejão efficacissimamente a sua ventura moral, e a sua ventura politica, como individuos unidos em sociedade, e diz-se que hum homem faz bom uso de sua natural razão, quando escolhe, e emprega os meios mais aptos, e porporcionados para aquelle fim. E será fazer bom uso da razão para ser feliz na ordem moral, não conhecer differença alguma entre o justo, e o injusto! Não se embaraçar com a qualidade dos meios, com tanto que se consiga o fim? Julgar licito, matar, roubar, calumniar, ou denegrir o seu similhante, para se avançar pelos caminhos da ambição! Julgar licito o furto com tanto que se empregue a maior força, e affirmar, como eu ouvi a hum, que a passagem violenta do dominio de quaisquer cousa de humas mãos para outras mãos não he delicto, porque a objecto arrancado não muda de essencia na sua passagem, e não ha mais que a differença de seu possuidor, e que nunca póde neste caso haver perturbacão na sociedade, porque o direito da propriedade, he quimerico, e se existe, he só fundado na maior força, e que por isto (continuava elle) erão licitas, e justas as conquistas, e usurpações de hum monstro? Será fazer hum bom uso da razão natural, não julgar o adulterio hum crime, mas hum simples galanteio, e só estranhado pelo Gotico, brusco, anti-social, e preocupado? E com que descaramento, e impudencia nos diz hum monstro tão desmoralizado como este, que emprega a sua vida na indagação da verdade, e que não tem outro intento mais que reformar, e regenerar o Mundo! E não vemos nós espalhados estes atrocissimos principios pelos escritos da escola encyclopedista, e no malvado Livro que se chama--Os Costumes?--E a marcha da Revolução, não foi coherente a estes principios? As acções de que somos testemunhas não são Corolarios destes infernaes theoremas de Helvecio! Ora ainda antes que falle no uso da razão que fazem os crentes, pelo que pertence á moral, não se envergonharão, e não se confundirão estes malevolos espiritos, em quem não cabe a sabedoria, se eu lhes disser que os mesmos Filosofos Pagãos, que inquirírão, e anciosamente buscárão o caminho da felicidade moral, fizeram melhor uso da sua razão constituindo a suprema ventura na pratica da virtude, e chamando virtude só áquillo que era conforme ao puro dictame da Natureza? Leião, e envergonhem-se, os principios de Socrates, quando se introduz em algum dos Dialogos de Platão, e os axiomas, e sentenças d'outros Filosofos que religiosamente nos guardárão Plutarcho, e Diogenes Laercio. Leião, se a tanto se atrevem, os escritos immortaes, e admiraveis de hum Marco Tulio, e fixem-se ao menos no sonho de Scipião, no Tratado das Obrigações Civís, e nas eloquentissimas dissertações sobre os verdadeiros bens, e os verdadeiros males. Leião as engenhosas, e eloquentes paginas de Seneca: os profundos pensamentos de Epiteto, e os Tratados sublimes do Filosofo Imperante Marco Aurelio. Oh desgraça digna de lagrimas de sangue! Que hão de lêr estes detestaveis monstros, cuja liberdade de pensar, de que tão cégamente se ufanão, voluntariamente se encadeia, e não tem outro uso livre, mais que a diversa modificação que lhe dá o discurso do Veneravel, que elles escutão com a face cosida com a terra, e com as encruzadas mãos acobertadas de sanguinarias luvas. Lancem-se os olhos para os actuaes resultados da Revolução, veremos quem faz melhor uso da razão na ordem moral, para a felicidade. E se eu contemplar os verdadeiros Christãos nesta mesma ordem moral? Bastará abrir o Evangelho, bastará demorar hum pouco a vista sobre a conducta dos primeiros fieis, sobre os escritos adoraveis dos primeiros Mestres do Christianismo. Dizei-me, he fazer máo uso da razão natural, assustar-se, não só com o crime, mas até com a idéa, e pensamento do mesmo crime? Será fazer máo uso da razão natural buscar a ventura, e tranquillidade da vida moral só pelo emprego, e pelo exercicio da virtude? Ser superior á inquieta, e turbulenta ambiçao, á desasocegada, e desconfiada avareza, ao sórdido, e vil interesse, á deslumbrada soberba, ao sórdido, e vil interesse da gloria popular, e finalmente, á vergonhosa incontinencia? Será fazer máo uso da razão natural, abraçar os dictames da temperança, fugir da glotonaria, ser moderado, paciente, humano, compasivo, sensivel, generoso? Será fazer máo uso da razão natural, chegar com isso, que tanto assoalhais, e não tendes, e a que chamais filantropia, a hum tão subido gráo de heroismo, que se amem, não só os homens em geral, como similhantes mas até os mesmos inimigos, porque são homens? Será fazer máo uso da razão natural vencer os movimentos tumultuosos da ira, e soffocar os internos brados de todas as paixões, apenas se fazem escutar nos coração do homem? Confrontesse a conducta aos verdadeiros Christãos, que no berço da Religião revelada apparecêrão no meio do Imperio da corrupção, e dos vicios com a conducta destes illuminados, que rejeitão, e desconhecem o foro interno da consciencia, e que não admittem para regra das acções humanas, mais do que o temor dos castigos temporaes, ou a esperança das recompensas terrenas, e então se conhecerá quem haja feito melhor uso da razão natural. Elles não querem conhecer senão delictos externos, e publicos, nós conhecemos além destes mesmos delictos, peccados, e reconhecemos até crime aquillo mesmo que não foi mais que lembrado, ou imaginado. Moral verdadeiramente pura, cuja sublime evidencia arrancou da boca do Sofista de Genebra aquelle admiravel elogio que elle faz ao Evangelho. Tanto póde a Verdade! A malicia, e a impiedade, nunca poderão contrastar sua victoriosa força! E poderá ainda dizer a impudencia, que nós os fieis não fazemos bom uso da nossa razão, quando buscamos a felicidade em a ordem moral? Se eu quero dilatar, e espraiar o pensamento pela ordem politica, e social em que os homens existem, ainda se torna mais patente a desgraçada condição da incredulidade, que ousa taxar-nos de irracionaes, e até mentecaptos. Veja o Mundo espantado, vejão os homens todos assombrados com o medonho quadro que lhe offerece a consternada Europa depois que rebentou o Volcão revolucionario, se he fazer bom uso da razão natural, ter preparado com sofisticas idéas de igualdade, e de liberdade o caos em que se afundárão todas as Jerarquias, todas as Classes, todas as Instituições, todas as Leis, que o pezo dos Seculos, e a vontade unanime, e universal dos homens havião sanccionado? He fazer bom uso da razão perturbar de tal maneira a sociedade, a titulo de lhe buscar em hum novo estado, e em huma nova ordem de cousas huma prometida, mas fantastica felicidade? Que procedimento tão chegado á razão, soltarem-se sanguinarios Tigres, e levados do instincto, ou da força de nunca vista ferocidade, derramarem rios de sangue, não só pela terra que os vio nascer, mas quasi por todo o globo atonito á novidade de scenas tão barbaras, e tão atrozes, vendo que ellas forão preparadas, conduzias, e executadas por aquelle mesmo Filosofismo orgulhoso, que se dizia regenerador do Mundo, e salvador da razão aviltada, e abatida aos pés do Fanatismo, e da Suprestição! He fazer bom uso da razão natural, preparar a assinte sobre as ruinas de Thronos, e sobre reliquias de Nações esmagadas, o Throno, ou as bases para se levantar o Colosso do mais atroz, e escandaloso Despotismo que vio o Mundo em os annaes da Tyrania! O que os nossos mesmos olhos estão vendo, e o que nós tão desgraçadamente temos sentido não exige mais próvas, e demonstrações; as lagrimas que temos derramado, o sangue que temos vertido, os males pezadissimos que temos suportado, mostrão bem a que ponto de melhoramento chegára o Mundo politico pelos esforços dos livres pensadores que tanto exaltão, e apregoão o bom uso da sua razão, e tanto taxão o nosso procedimento de hum rematado desvario. E podereis dizer, malevolos, e publicos perturbadores da paz, e do socego das Nações, que o verdadeiro fiel faz máo uso da sua razão, em quanto permanece tranquillo naquella situação em que o constutuio a Providencia, sugeito como lhe manda a Religião ás Potestades dominantes, sem murmurar, sem innovar, sem rebelar, reconhecendo na suprema Jerarquia a authoridade emanada de Deos. Quando se vírão, oh Ceos! Com que pejo o digo! Quando se vírão em Portugal tantos pérfidos, tantos traidores votados já á execração, e indignação publica, pelas decisões de rectissimas Sentenças? No Seculo do illuminismo, em que se diz se levantára o bom uso da razão sobre o abatido fantasma de velhas preoccupações. E he fazer bom uso da razão natural, conjurar contra a propria Patria, contra a propria Nação, querer lançar-lhe ao colo os ferros de hum Tyranno, despoja-la de sua gloria, soberania, independencia, representação, e grandeza? Será fazer bom uso da razão natural attrahir sobre a propria cabeça os males que preparavão aos outros? Será fazer bom uso da razão natural sacrificar a hum monstro que permanece em huma absoluta ignorancia da sua existencia, a reputação, a liberdade, o estabelecimento, e a ternissima posse daquella Patria, e daquelle Reino que lhes deo o berço? Confronte-se o uso da razão que fazem estes profundos pensadores, com o uso da razão que faz o honesto Cidadão, ainda que seja o mais ignorante, e idiota, e conhecer-se-ha com evidencia de que parte esteja a vantagem. Mas he tão grande, e tão profunda a cegueira, ou a pertinacia destes monstros, que nenhuma razão os convence, porque huma alma malevola não dá entrada á verdadeira sabedoria. Fieis, fechai os ouvidos aos enganadores discursos dos impios, debaixo de sua lingoa existe o veneno dos áspides, elles errão, e errarão sempre, _erraverunt ab utero, locuti sunt falsa_. Fugi do precipicio a que vos conduz sua revoltosa doutrina. Sabei que não querem Throno, não querem Altar, não querem Leis. Segui as maximas celestiaes da Religião, cujas luminosas provas longe de aviltarem a razão, a enobrecem, a purificão, a exaltão, e fazendo o verdadeiro homem de bem na terra, em quanto o tornão virtuoso, nos assegurão, e affianção huma eterna Bemaventurança. Disse. End of the Project Gutenberg EBook of Sermão contra o Filosofismo do Seculo XIX, by José Agostinho de Macedo *** END OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK SERMÃO CONTRA O FILOSOFISMO *** ***** This file should be named 33245-8.txt or 33245-8.zip ***** This and all associated files of various formats will be found in: http://www.gutenberg.org/3/3/2/4/33245/ Produced by Pedro Saborano Updated editions will replace the previous one--the old editions will be renamed. Creating the works from public domain print editions means that no one owns a United States copyright in these works, so the Foundation (and you!) can copy and distribute it in the United States without permission and without paying copyright royalties. Special rules, set forth in the General Terms of Use part of this license, apply to copying and distributing Project Gutenberg-tm electronic works to protect the PROJECT GUTENBERG-tm concept and trademark. 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